INTRODUÇÃO
A língua portuguesa, também designada português, é uma língua românica flexiva originada no galego-português falado no Reino da Galiza e no norte de Portugal. Com a criação do Reino de Portugal em 1139 e a expansão para o sul como parte da Reconquista deu-se a difusão da língua pelas terras conquistadas e mais tarde, com as descobertas portuguesas, para o Brasil, África e outras partes do mundo. Porém nestas regiões encontramos algumas diferenças no que diz respeito à ortografia, semântica e fonética da língua portuguesa.
Evolução Da Língua Portuguesa No Tempo E No Espaço
A língua vária no tempo e no espaço da sua utilização, ao longo da sua própria história, bem como da vida dos seus falantes, decorrente de determinantes sociais, culturais, históricas, geográficas, profissionais e académicas. Isto pode ocorrer em todos os níveis (fonético, fonológico, sintáctico, semântico, morfológico, paradigmático, etc.).
Assim, podemos considerar as seguintes variações:
Variações geográficas ou diatópicas — as variedades linguísticas que, em certa região, apresentam características bastantes para as diferenciarem da língua comum de uma determinada sociedade. São os dialectos ou falares regionais;
Variações sociais ou diastráticas — variações linguísticas provocadas pelas características de falante e de grupo e pelas circunstâncias da situação comunicativa. São os dialectos sociais, níveis ou registos de língua. Tal como sublinha Moura (2009: 265), um falante pode usar diferentes níveis de língua (corrente, popular, cuidado, familiar e literário, sem excluir o calão e a gíria);
Variações difásicas: – diferenças entre os tipos de modalidade expressiva (língua falada, língua escrita, língua literária, etc.).
Neste capítulo, interessam-nos as variações diatópicas entre Brasil e Moçambique. Tal como referem Mateus et alii (2003:34), em línguas com larga história de expansão mundial e de mobilidade dos seus falantes nativos, tais como o português europeu e o brasileiro, observa-se a existência de variedades que se vão progressivamente fixando e autonomizando. Esta variação é um ganho para a própria língua, pois enriquece-se o léxico com a introdução de palavras novas relativas aos diversos universos de referenda.
«Exemplos das variações entre o português de Moçambique e o português do Brasil
Todas as variedades linguísticas são estruturadas e correspondem a sistemas e subsistemas adequados as necessidades dos seus usuários. Mas o facto de a língua estar fortemente ligada a estrutura social e aos sistemas de valores da sociedade conduz a urna avaliação distinta das características das suas diversas modalidades diatópicas, diastráticas e difásicas», defendem Cunha & Cintra (1991).
A língua portuguesa apresenta algumas diferenças quanto a utilização que dela se faz em alguns países do mundo.
Entre o português falado em Moçambique (PM) e o português falado no Brasil (PB), por exemplo, existem algumas diferenças. Vamos analisar com mais pormenor algumas dessas diferenças.
Por exemplo, enquanto no PM dizemos «Hoje, a Maria não apareceu por aqui», no PB diz-se «Hoje, Maria não apareceu por aqui»
Portanto, o que difere nas duas construções é que na primeira construção (PM) o artigo antecede o substantivo ou nome (Maria), ao passo que na segunda construção (PB),o substantivo ocorre sem nenhum artigo a antecedê-lo.
Podemos, assim, depreender deste exemplo que no PB omitem-se os artigos, ou seja, os substantivos ou nomes ocorrem sem determinantes ou artigos a antecedê-los, enquanto no PM não se verifica tal irregularidade.
Vamos ver uma outra situação:
PM: Vou comprar o meu vestido. PM: Não conheço a sua mulher.
PB: Vou comprar meu vestido. PB: Não conheço sua mulher.
Outro exemplo, no PB, diferentemente do PM, registam-se as seguintes ocorrências:
• A palatalização do ti e di (em palavras como tia, sete, dia);
• A semivocalização do L final de sílaba e de palavra (Brasil, capital, funil, canal);
• Introdução do I entre duas consoantes (casos anteriores e também aptidão).
Tomando como base os exemplos acima apresentados, podemos salientar que, quanto ao nível morfológico e sintáctico, no PB é habitual, antes do possessivo pronominal, a ausência do artigo. Pelo contrário, no PM temos sempre o artigo a anteceder o possessivo pronominal, salvo nos casos em que a frase é construída incorrectamente. As regras, porém, ditam a colocação do artigo antes do possessivo pronominal ou antes do substantivo.
Todas as variedades linguísticas são estruturadas e correspondem a sistemas e subsistemas adequados as necessidades dos seus falantes. Mas o facto de a língua estar fortemente ligada a estrutura social e aos sistemas de valores da sociedade conduz a uma avaliação distinta das características das suas diversas variações diatópicas, diastráticas e difásicas (Cunha &
Resumidamente, podemos definir cada uma destas variações do seguinte modo:
Variações diatópicas — são as que se referem a falares locais, regionais e intercontinentais (como é o caso do português do Brasil e do português de Moçambique).
• Variações diastráticas — são as que se referem as diferenças verificadas na linguagem das várias camadas socioculturais.
• Variações difásicas — são as que dizem respeito aos diferentes tipos de modalidade expressiva (língua falada, escrita, literária).
• Neste contexto, é ainda importante distinguir dialecto de língua padrão.
O português falado em todo o mundo é, apesar de tudo, uma língua bastante homogénea, devido a acção de diversos factores, entre os quais se destacam a ampla difusão dos meios de comunicação e a implantação do ensino obrigatório. O traço de união entre as variedades que se registam nos diferentes países é a língua padrão, que funciona como um modelo linguístico. Entre as muitas variedades de uma língua, há uma que se destaca e é escolhida pela sociedade como modelo. A língua padrão é a variedade social de uma língua que foi legitimada historicamente enquanto meio de comunicação da classe média e da classe alta de uma comunidade linguística.
Os acontecimentos históricos, os contactos com falantes de outras línguas, o tempo, entre outros factores, determinaram que o português se fosse progressivamente diferenciando de região para região. Sofreu numerosas mudanças a medida que se foi implantando em diferentes espaços geográficos, mudanças essas que deram origem a diversas variedades. Em cada região encontramos uma variedade distinta, com os seus traços particulares. No Brasil não se fala um português idêntico ao de Moçambique e mesmo em Moçambique há diferenças entre o falar de um falante do Norte e o de um falante do Sul.
Chamamos variedades geográficas, dialectos regionais ou, simplesmente, dialectos a estas diferentes formas que a língua apresenta consoante as regiões em que é falada.
EVOLUÇÃO DA LÍNGUA PORTUGUESA NO TEMPO
Do indo-europeu ao latim
O estudo comparado de diversas línguas da Europa e da Ásia levou os linguistas a pensar que estas terão derivado de uma língua comum: o indo-europeu. Com excepção do basco, codas as línguas oficiais dos países da Europa Ocidental pertencem a quatro ramos da família indo-europeia: o helénico (grego), o românico (português, italiano, francês e castelhano), o germânico (inglês e alemão) e o céltico (irlandês e gaélico). um quinto ramo, o eslavo, engloba diversas línguas actuais da Europa Oriental.
Do ramo românico fazem parte as línguas que derivaram do latim, uma das quais é a língua portuguesa.
Do latim às línguas românicas
O latim era a língua falada no Lácio (região de Roma), que se propagou além-fronteiras com a romanização — processo de conquista territorial e dominação cultural efectuado pelos Romanos.
O latim apresentava diferentes variedades e registos linguísticos: o latim clássico e o latim vulgar. Foi esta última variedade que se expandiu com a romanização, pois era a língua utilizada pelos legionários, os soldados que participaram na expansão do Império Romano. Noutros locais, entrando em contacto com outras línguas e culturas, o latim sofreu modificações e diferenciações, originando primeiro os romanços e, depois, as línguas românicas ou novilatinas, constituídas pelas seguintes línguas: português, espanhol ou castelhano, italiano, francês, romeno, sardo e provençal.
Influência de outros povos
O SUBSTRATO
a) O substrato celta
Os povos que habitavam a região da Península ibérica antes da romanização falavam outras línguas, sobretudo a celta. Embora os povos vencidos tenham adoptado a língua dos vencedores (os Romanos), foram também transportados para o latim termos dessas línguas autóctones. O latim foi, assim, ganhando novas palavras oriundas da língua celta que se falava na Península Ibérica.
Exemplos de palavras de origem celta: camisa, carro, saia, carpinteiro, Lisboa, Coimbra, Évora.
O SUPERSTRATO
a) O superstrato germânico
Por volta do século V d. C., os povos germânicos invadiram a Península ibérica. Como possuíam uma cultura inferior, adoptaram a língua dos vencidos (o latim), mas introduziram-lhe palavras da sua língua.
Exemplos de palavras de origem germânica: guerra, arreio, bradar, galope, marchar, roubar, luva, orgulho, dardo, casa, raça, Afonso, Fernando, Gomes.
b) O superstrato árabe
No século VIII, a Península sofreu uma nova invasão, desta vez pelos Árabes. A presença árabe prolongou-se por vários séculos e, assim, muitas palavras de origem árabe entraram na língua portuguesa (muitas delas iniciadas por al): álcool, alambique, alecrim, alfaiate, algarismo, armazém, azul, garrafa, fatia, oxalá, xadrez, xarope e muitas outras.
Do português arcaico ao português moderno
PORTUGUÉS ARCAICO (DE FINS DO SÉCULO AO SÉCULO XVI)
Neste período, o português evolui sem influências de outras línguas. Até meados do século XIV, esteve associado ao galego, originando o galego-português ou galaico-português.
Considera-se que o português nasceu oficialmente no século XIII, quando D. Dinis legislou que todos os documentos fossem escritos em português.
PERIODO CLÅSSICO (DO SÉCULO AO SÉCULO XVII)
Com a expansão marítima, nos séculos XV e X VI, a língua portuguesa passou a ser falada em muitas regiões de África, Ásia e América, tendo sido, nesta altura, enriquecida com vocábulos provenientes dessas culturas.
A partir do século XII, com a intensificação das relações comerciais e culturais de Portugal com outros países europeus, vários termos de outras línguas foram adoptados pela língua portuguesa: são os estrangeirismos.
PERIODO MODERNO (DO SÉCULO XVIII EM DIANTE)
Além da evolução sofrida pela língua portuguesa resultante do contacto com outras línguas, também a necessidade de nomear novos objectos e novas realidades vai dando origem à criação de novas palavras: os neologismos.
Evolução fonética
Multas palavras do português provém do Patim e resultam de transformações sofridas ao longo de séculos, quase sempre pela tendência de os falantes reduzirem o esforço ao pronunciar alguns sons.
FENÓMENO | EXEMPLO |
Queda | attonitu > tonito > tonto plenum > pleno |
Adição | stare > estar humile > humilde |
Permuta | semper > sempre absente > ausente |
Evolução semântica
A evolução semântica consiste na alteração de significado de certas palavras, ao longo dos tempos.
| Significado antigo | Significado actual |
Barba | Queixo, rosto, mento | Camada pilosa que cobre partes do rosto |
Calamidade | Vendaval que destruía colheitas | Desgraça de grandes proporções |
Cara | Mais querida | Rosto (raciocínio: parte mais querida do corpo) |
Desastre | Perda de um astro | Acidente, desastre, sinistro, fatalidade, fruto do azar |
Ministro | Escravo, servidor | Cargo superior (raciocínio: significado distante do sentido humilde que tinha) |
O português de África
A partir do contacto que o português teve com as línguas africanas, através da expansão levada a cabo pelo processo de colonização, a língua foi ganhando outras variedades que divergem da norma portuguesa de maneira mais ou menos acentuada quanto à pronúncia, à gramática e ao vocabulário. Contudo, tal diferenciação não é suficiente para impedir a comunicabilidade entre os falantes, nem a superioridade de uma variedade em detrimento de outra.
Em certos casos, o português, entrando em contacto com algumas línguas de Africa, deu origem aos crioulos — línguas originadas a partir da aglutinação de outras; são os casos de crioulos de Cabo Verde e da Guiné.
O português de Moçambique
Moçambique é um pais que apresenta um panorama linguístico bastante diversificado.
Falam-se várias línguas derivadas da antiga língua bantu, algumas das quais são: kimwani, shi-makonde, ci-yao, cinyanja, e-makhua, e-chuabo, ci-nyungue, ci-seno, ci-balke, ci-shna, gitonga, ci-copi, xi-ronga, xitswa, xi-xangana e vários outros dialectos destas línguas.
O português é a língua oficial do Pais, eleita após a Independência Nacional. Naturalmente, este é influenciado pelas línguas nativas e pelas suas variedades dialectais, distribuídas por diferentes espaços físicos do Pais; por isso, é legitimo falar-se de falares locais do português em Moçambique. Assim, os Macuas, por exemplo, irão expressar-se em português diferentemente dos Senas, dos Nyugues ou dos Ndaus, no que respeita a vários aspectos da gramática.
Vejamos, seguidamente, as diferentes mudanças da língua portuguesa falada em algumas regiões de Moçambique.
Especificidades do português de Moçambique
As diferenças entre o português-padrão e o português falado em Moçambique são visíveis a vários níveis:
• Classe lexical (pronomes, artigos e preposições)
Exs.: O meu pai agarrou ele (agarrou-o).;
Tinha cortado cabelos (cortado os cabelos).
• Concordância (número, género, pessoa, tempo, modo e voz)
Exs.: Os donos da mala viu (viram).;
Esta senhora é amigo (amigo).
• Tipo de estrutura sintáctica (subordinação e coordenação)
Exs.: Para que as coisas crescer melhor (cresçam melhor).;
Chegou o dizer que não tens vergonha (que ele não tinha vergonha).
• Escolha lexical dos verbos, nomes e adjectivos
Ex.: Indivíduos passageiros (que estão de passagem).
• Semântica (atribuição de novo significado a palavras do português)
Ex.: Chegaram as estruturas (responsáveis do Governo).
• Casos como: calamidade = roupa em segunda mão; pasta = mala (saco) de mão; situação = problema; crise = guerra.
• Ordem sintáctica
Ex.: Eu estou cada vez mais a Pintar (estou a Pintar coda vez mais).
CONCLUSÃO
Terminado trabalho, pudemos concluir que cada região geográfica, constrói uma “Lei ortográfica” para melhor unificar os falantes dessa língua. Contudo este aspecto não tem sido muito eficaz, pois a língua varia consoante a regia e com o tempo.
Entrando um pouco mais profundamente no trabalho, constatamos que a principal diferença entre o PM e PB reside essencialmente na pronúncia, quando comparamos as duas variantes. Os brasileiros possuem um ritmo de fala mais lento, no qual tanto as vogais átonas quanto as vogais tónicas são claramente pronunciadas. Nota-se também que Algumas construções sintácticas comuns no Brasil não costumam ser utilizadas em Portugal.
REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA
• CINTRA, Nova Gramática do Português Contemporâneo, Edições João Sá da Costa, 1991, Lisboa
• GONÇALVES, Perpétua, A construção de uma gramática do português de Moçambique: aspectos da estrutura argumental dos verbos, Lisboa, 1990
• HAMILTON, Russell, A literatura dos países africanos de língua oficial portuguesa. Edições Cosmos e Cátedra Jorge de Sena, Rio de Janeiro, 2000
• MATEUS, Maria Helena Mira, Português europeu e português brasileiro: duas variedades nacionais da língua portuguesa. Gramática da Língua Portuguesa, 5.ª ed., Lisboa, 2003